Ativistas protestam por ação climática na Europa (Foto: Greenpeace)

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Adaptação reduziu em 80% mortes por calor na Europa em 2023

Ainda assim, ano mais quente da história matou mais de 47 mil pessoas no continente, mostrou estudo; além de adaptar, é urgente reduzir emissões, alertam cientistas

13.08.2024 - Atualizado 23.08.2024 às 18:42 |

DO OC – Estudo divulgado nesta segunda-feira (12/8) mostrou que a tragédia climática do verão de 2023 na Europa teria sido ainda maior se medidas de adaptação ao clima extremo não tivessem sido implementadas nas últimas duas décadas. A pesquisa, publicada no periódico científico Nature Medicine, estimou que mais de 47 mil pessoas morreram por causa do calor no verão europeu do ano passado. Sem adaptação, indicou a pesquisa, as mortes chegariam a 85 mil, cifra 80% maior. 

O ano de 2023 foi o mais quente da história, considerando a temperatura média global, e o segundo mais quente da Europa. A sequência de eventos climáticos extremos contou, além das temperaturas próximas do recorde histórico na Europa, com degelo recorde do mar da Antártida ainda no inverno, calor extremo  na Ásia, número acima da média de ciclones tropicais intensos, ondas de calor em sequência na América do Sul e os piores incêndios florestais já registrados no Canadá, para citar alguns exemplos. 

Através de um estudo de modelagem,  a equipe de cientistas liderada por Elisa Gallo, do Barcelona Institute for Global Health (ISGlobal), analisou os registros de mortes na base do Escritório de Estatísticas Europeu (Eurostat) para 35 países. A conclusão foi que, entre 29 de maio e 1º de outubro de 2023, 47.312 mortes foram induzidas pelo calor. Segundo os pesquisadores, dois grandes eventos de temperaturas extremas no verão europeu de 2023 – ocorridos em meados de julho e final de agosto – responderam por cerca de 27 mil mortes, ou 57% do total. 

A metodologia utilizada foi a mesma de outro estudo, publicado na Nature Medicine no ano passado, que estimou mais de 60 mil mortes por calor no verão europeu de 2022 – a maior taxa da década. Utilizando registros de temperatura e de mortalidade de 823 regiões nos 35 países para o período de 2015 a 2019, os cientistas estimaram as mortes considerando as temperaturas de 2023. 

Os países mais atingidos foram os do sul da Europa, com a Grécia no topo da lista (com 393 mortes por milhão de habitantes), seguida por Bulgária (229 mortes/milhão de habitantes), Itália (209), Espanha (175), Chipre (167) e Portugal (136). Em números absolutos, a Itália teve o maior número de mortes por calor estimadas (12.743 pessoas), seguida por Espanha (8.352), Alemanha (6.376) e Grécia (4.339). 

Os autores, no entanto, alertam para uma margem de erro, que pode subestimar o número de mortes induzidas pelo calor. Como não há dados diários sobre as mortes registradas no ano de 2023 na Europa, a saída foi utilizar levantamentos semanais da base Eurostat. Recentemente, um outro artigo dos mesmos autores, publicado na Lancet Regional Health – Europe, analisou como o uso de dados semanais pode subestimar as mortes relacionadas ao calor e apresentou um método para corrigir o desvio. Segundo os cientistas, a taxa real de mortes por calor em 2023 pode ter sido de cerca de 58 mil pessoas nos 35 países analisados. 

Segundo o artigo, a vulnerabilidade dos países europeus ao calor diminuiu progressivamente ao longo dos anos, graças à adoção de medidas de adaptação climática. Para chegar a essa conclusão, os cientistas estimaram a relação entre temperaturas e mortes causadas por calor para os períodos de 2000 a 2004, 2005 a 2009, 2010 a 2014 e 2015 a 2019. A conclusão foi que, caso as temperaturas de 2023 tivessem ocorrido entre 2000 e 2004, as mortes por calor chegariam a mais de 85 mil, número 80,8% maior do que o estimado para o ano passado. 

“Nossos resultados mostram que houve processos de adaptação social às altas temperaturas no século 21, o que reduziu drasticamente a vulnerabilidade e a carga de mortalidade relacionada ao calor nos verões recentes, especialmente entre os idosos”, diz Elisa Gallo, autora principal do estudo. Segundo a autora, desde os anos 2000 a chamada temperatura de mortalidade mínima – a temperatura ótima com menor risco de mortalidade – tem aumentado gradualmente, de 15ºC em 2000-2004 para 17,7ºC em 2015-2019. 

“Isso indica que somos menos vulneráveis ao calor do que éramos no início do século, provavelmente como resultado do progresso socioeconômico geral, melhorias no comportamento individual e medidas de saúde pública, como os planos de prevenção ao calor implementados após o verão recorde de 2003”, acrescenta Elisa Gallo. Naquele ano, uma onda de calor matou mais de 70 mil pessoas no continente. 

Elementos como o aprimoramento dos serviços de saúde para lidar com ondas de calor, o incremento da proteção social, a atenção às condições de trabalho e à ventilação de edifícios, o maior conhecimento dos riscos, o desenvolvimento de sistemas de alerta para o calor e a difusão de orientações mais precisas à população foram destacados no artigo como definitivos para que a vulnerabilidade ao calor extremo tenha sido reduzida. 

No entanto, destacam os autores, a adaptação não será suficiente se as causas da crise do clima não forem atacadas. “ Essas medidas de adaptação devem ser combinadas com esforços de mitigação por parte dos governos e da população em geral para evitar o alcance de pontos de inflexão e limites críticos nas projeções de temperatura”, afirmou Joan Ballester Claramunt, pesquisador do European Research Council (ERC) e autor do artigo. (LEILA SALIM)

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