Manifestante em frente a torres de resfriamento de termelétrica na Polônia (Foto: Greenpeace)

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Emissões precisam cair 7,6% ao ano até 2030, diz ONU

Nova edição do relatório Emissions Gap afirma que Brasil é um dos sete países que se afastaram da trajetória do Acordo de Paris

26.11.2019 - Atualizado 11.03.2024 às 08:29 |

CLAUDIO ANGELO
DO OC

Nós ainda não atingimos a meta, mas precisamos quintuplicar a meta. Poderia ser Dilma Rousseff, mas é a ONU quem está dizendo. A meta, no caso, é a de redução de emissões de gases de efeito estufa para que a crise do clima não cozinhe o planeta nas próximas décadas.

Foi lançado em Genebra nesta terça-feira (26) o relatório Emissions Gap, da ONU Meio Ambiente. Em sua décima edição, o documento relata todos os anos o abismo entre onde estamos e onde precisamos estar no combate aos gases que aquecem a atmosfera.

A edição de 2019 mostra que, se a humanidade quiser ter uma chance de 66% ou mais de limitar o aquecimento global em 1,5oC, será preciso cortar as emissões globais de gás carbônico em 7,6% todos os anos daqui até 2030. Para a estabilização em 2oC, meta menos ambiciosa do acordo do clima de Paris, as reduções são de “apenas” 2,7% ao ano.

Para dar uma ideia do tamanho do esforço envolvido, o Brasil emite cerca de 3% do carbono do mundo. Estabilizar o clima conforme o objetivo mais ambicioso do Acordo de Paris significa eliminar mais de dois Brasis por ano da matriz global de emissões.

Isso não tem precedentes na história da civilização industrial. A maior queda global de emissões de um ano para o outro em tempos recentes ocorreu em 2009, por conta da Grande Recessão iniciada no ano anterior. Ela foi de 1,1%.

Como a ONU não pode dizer com todas as letras que a tarefa é impossível, o relatório simplesmente declara: “Não há sinal de um pico nas emissões acontecendo nos próximos anos”. Como diria Carlos Bolsonaro, tirem suas “conslusões”.

Pior ainda, alguns dos maiores poluidores do mundo estão na contramão dos esforços de controle de emissões. Segundo o relatório, 78% das emissões de CO2 do planeta – que em 2018 atingiram 55,3 bilhões de toneladas – se concentram nos países do G20. Só que sete deles não estão cumprindo nem mesmo suas modestas NDCs, as promessas de redução que fizeram em Paris. São eles: Austrália, Canadá, Japão, Coreia, África do Sul, EUA, que está de saída do acordo e o Brasil.

O Brasil teve suas estimativas de emissões anuais revisadas para cima devido ao aumento do desmatamento.

O relatório foi fechado antes da divulgação dos dados do Inpe que mostraram um aumento de 30% da taxa oficial de desmatamento da Amazônia em 2019, mas enumera uma série de decisões políticas tomadas pelo governo Bolsonaro que enfraqueceram a capacidade de cumprir a NDC: “O presidente Bolsonaro reduziu significativamente os recursos para mudanças do clima no Ministério do Meio Ambiente, relaxou regras para a conversão de multas ambientais, estendeu o prazo [do Cadastro Ambiental Rural] e aboliu a maioria dos colegiados com participação da sociedade civil”.

Curiosamente, a recomendação que o relatório faz ao Brasil para reduzir suas emissões nada tem a ver com florestas e desmatamento, mas sim com a “agenda urbana”, termo popularizado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que no início do mandato havia dito que priorizaria essa pauta. O Gap Report recomenda ao Brasil que invista em carros elétricos e na descarbonização do transporte.

O viés energético se explica pelo fato de o único autor brasileiro do relatório ser um especialista em energia, William Wills, da Coppe-UFRJ.

TORNIQUETE

O relatório chega às vésperas da COP25, a conturbada conferência do clima de Santiago, que começa na próxima segunda-feira (2) em Madri. A ONU espera que ele ajude a balizar uma conversa séria sobre aumento da ambição das metas que estão na mesa.

As NDCs são altamente insuficientes para conter a crise do clima. Se todas elas forem cumpridas à risca, espera-se que a humanidade chegue a 2030 com emissões de cerca de 53 bilhões de toneladas de CO2. Nesse caso, ainda faltaria 12 bilhões de toneladas para chegar ao valor mediano de 41 bilhões de toneladas compatível com uma estabilização em 2oC. E 29 bilhões de toneladas para uma trajetória de emissões compatível com 1,5oC.

“A análise reafirma que as nações devem triplicar seus esforços atuais (…) para limitar o aquecimento a 2oC e multiplicá-los por pelo menos cinco para alinhar ação e emissões com a limitação do aquecimento perto de 1,5oC”, diz o relatório.

Em 2020, os países deverão entrar no primeiro ciclo de revisão de suas NDCs, para aumentar a ambição das metas para 2030.

Nada nem remotamente parecido com o esforço demandado pela ciência está em discussão. A COP25 está mais voltada à discussão de temas técnicos, como o mercado de carbono. Países pobres, os que mais vêm perdendo com o aquecimento global, estão pressionando para que a necessidade de aumento sem precedentes na ambição seja refletida em uma das decisões de Madri. Pode ser que tenham de esperar sentados.

Afinal, o segundo maior emissor do mundo nem na mesa está mais. E o sétimo maior emissor, que não quis nem mesmo sediar a conferência, acredita que o aquecimento global seja causado por termômetros mal posicionados.

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