#NEWS

Por uma precificação positiva do carbono

22.06.2015 - Atualizado 11.03.2024 às 08:26 |

ALFREDO SIRKIS

ESPECIAL PARA O OC

No final deste ano, na COP21, em Paris, os países-membros das Nações Unidas tentarão um novo acordo para o clima. Este possivelmente consagrará certos avanços incrementais, mas dificilmente garantirá uma redução de emissões de gases-estufa suficiente para manter a sua concentração na atmosfera abaixo das 450 partes por milhão e a temperatura média do planeta, até o final do século, abaixo dos 2 graus Celsius. A questão sempre subjacente às COPs, mas mas nunca de fato enfrentada nelas, é a do efetivo financiamento da transição para economias de baixo carbono. As cifras (e cobranças) evocadas nessas conferências do Clima beiram o ridículo: giram em torno do Fundo Verde do Clima, envolvendo alguns milhões aqui, algumas centenas lá, uma meta sempre distante de chegar a US$ 100 bilhões, anuais, em 2020 e nos anos subsequentes, na qual ninguém de fato acredita. É um jogo político de empurra-empurra entre negociadores profissionais – em resumo, conversa para boi dormir. Compare-se isso à estimativa realista dos investimentos necessários para essa transição: globalmente falando de US$ 1 trilhão por ano, isso apenas no setor de energia!

Essa cifra nada tem de absurda. Observe-se, de passagem, que, segundo o FMI, só em subsídios diretos a combustíveis fósseis o mundo gasta anualmente perto disso (somando-se os indiretos, seriam US$ 3 trilhões!). No entanto, os governos em geral, com seus déficits, endividamento e reservas limitadas, têm grandes dificuldades para dispor desses recursos. Mobilizá-los dependerá de taxar as emissões de carbono – substituindo outros tributos – e/ou de “precificar positivamente” a redução do carbono, atribuindo-lhe valor social e valor financeiro conversível.

A primeira solução, taxar diretamente o carbono, é uma batalha a ser travada em cada país, internamente, pois os sistemas tributários são nacionais. Não é fácil, como atesta o recentemente ocorrido na Austrália e na França, países que instituíram taxas-carbono e depois recuaram sob cerrado fogo político. Um caminho de menor resistência é reconhecer a redução de carbono como uma unidade de valor conversível. Uma espécie de “padrão ouro” dos tempos da crise climática global. O Brasil deu passo nesse sentido ao submeter à ONU, antes da COP de Lima, em 2014, uma proposta concebida na sociedade civil e encaminhada ao governo pela Comissão de Mista de Mudanças Climáticas do Congresso que declara o “valor social e econômico da redução de carbono” e prevê que ela venha a se tornar uma “unidade de valor financeiro conversível”.

Há uma base objetiva para tanto: hoje as perdas da economia global, em consequência das mudanças climáticas, num horizonte temporal dado, são perfeitamente quantificáveis. Isso já foi feito no famoso Relatório Stern, que as estimou em, no mínimo, 5% do PIB mundial. A partir daí pode-se estabelecer o valor de cada tonelada de emissões de CO2 suprimida. Esse reconhecimento dá ensejo a vários mecanismos possíveis de “moeda do clima” que inclusive podem dar uma direção produtiva às práticas de quantative easing (oferta de liquidez) que bancos centrais como o FED norte-americano vem realizado e que outros como o europeu deveriam implementar urgentemente para fazer frente à deflação recessiva que assombra o continente.

Por outro lado, o sistema financeiro internacional armazena mais de US$ 200 trilhões. Existe no mundo um brutal excesso de liquidez que pouco irriga a economia produtiva global. Essa situação é propícia às “bolhas” e crises como a de 2008. O desafio é atrair uma parte que seja desse capitais para investimentos produtivos de baixo carbono capazes de garantir um novo ciclo de crescimento, inovador e gerador de empregos. Os efeitos serão benéficos não apenas ao clima, como também à macroeconomia global na sua busca de um novo ciclo produtivo. O objetivo é estabelecer uma nova ordem financeira internacional para uma era de baixo carbono para a qual não há mais tempo a perder: um Bretton Woods do baixo carbono.

Alfredo Sirkis é escritor, jornalista e diretor do Centro Brasil no Clima (CBC)

Related

Nossas iniciativas