DO OC – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou a quatro ministros que elaborem em 60 dias uma proposta de resolução para o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) que lance as bases de um mapa do caminho para o Brasil fazer sua “redução gradativa da dependência de combustíveis fósseis”.
Com a medida, Lula busca implementar nacionalmente aquilo que ele quis ver como resultado da COP30: um plano global para definir os critérios e os prazos de saída dos combustíveis fósseis.
Na conferência de Belém, Lula discursou quatro vezes sobre a necessidade de dois mapas do caminho: um para “superar a dependência” de petróleo, gás e carvão, e outro para zerar e reverter o desmatamento até 2030. Ambas as propostas foram derrotadas na negociação. No entanto, durante a conferência, mais de 80 países demonstraram apoio ao mapa do caminho sobre combustíveis fósseis – a ponto de, no encerramento, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, anunciar que criaria os dois roteiros ao longo de 2026, usando seu mandato de presidência, que se encerra em novembro.
O despacho presidencial desta segunda-feira (8/12) convoca os ministérios da Fazenda, de Minas e Energia, do Meio Ambiente e da Casa Civil a apresentar os termos de referência para o desenho do mapa do caminho de energia e a “propor mecanismos de financiamento adequados à implementação da política de transição energética, inclusive a criação do Fundo para a Transição Energética, cujo financiamento será custeado por parcela das receitas governamentais decorrentes da exploração de petróleo e gás natural”.
O fundo, anunciado por Lula durante a Cúpula de Líderes de Belém, retoma o sentido original do Fundo Clima, criado em 2009, de usar recursos do petróleo para financiar a ação climática. Com a mudança da lei do petróleo em 2012 e a criação do regime de partilha do pré-sal, o Fundo Clima acabou ficando subfinanciado. O anúncio em Belém pegou de surpresa o próprio ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
A proposta do mapa do caminho doméstico começou a ser discutida na semana passada entre Lula e os ministros Marina Silva (Meio Ambiente), Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa (Casa Civil) e Silveira. Uma nova reunião dos quatro seria realizada nesta semana, mas Marina quebrou uma vértebra na semana passada e ficou afastada do ministério. Lula se adiantou e publicou o despacho.
Segundo um interlocutor próximo do processo, o Brasil fará o desenho de sua proposta de “redução gradativa da dependência” de fósseis enquanto a dupla que preside a COP30, André Lago e Ana Toni, trabalha no roteiro internacional para estabelecer os critérios de justiça, ordenamento e equidade da transição global. O entendimento é que o país não precisa esperar o estabelecimento de critérios internacionais para começar a pensar no desmame do petróleo, hoje principal produto de exportação brasileiro. Ao fazer a lição de casa, o país que propôs os mapas do caminho na COP tenta dar o exemplo, especialmente para os países ricos, principais responsáveis pela expansão da produção desses combustíveis.
Pelo menos dois deles já sinalizaram disposição para tratar do assunto: o Reino Unido, que neste ano fechou sua última usina a carvão e sinalizou em sua meta climática (NDC) para 2035 que pretende suspender novos projetos de óleo e gás. E a Noruega, maior produtora da Europa ocidental, anunciou na semana passada que formará uma comissão para estudar cenários potenciais de uma economia pós-petróleo. As reservas do país estão em declínio.
“É notável como a linguagem relativa à transição energética fica mais diluída a cada passada pela roleta da política. A ‘eliminação gradual’ dos combustíveis fósseis virou ‘transição para longe dos combustíveis fósseis’ em 2023 em Dubai, ‘superação da dependência’ dos fósseis em Belém e, agora, no Brasil, ‘redução gradativa da dependência’”, afirma Claudio Angelo, coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima. “Mesmo assim, o presidente Lula parece estar levando a sério a proposta do mapa do caminho. Se o Brasil, país em desenvolvimento e oitavo maior produtor de petróleo do mundo, demonstrar que está disposto a seguir o que prega, fica mais difícil para os outros países alegar dificuldade.”