Foto: Felipe Werneck

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Assessor de Salles é acusado pela PF de interceder no Ibama

Em seu perfil no Linkedin, Leopoldo Butkiewicz se apresenta como advogado "em ações judiciais em face da Administração Pública"

24.05.2021 - Atualizado 11.03.2024 às 08:29 |

A investigação da Polícia Federal (PF) que resultou na busca e apreensão em endereços do ministro Ricardo Salles nesta quarta-feira (19/05) revelou a interferência direta de um assessor de Salles em autuações contra criminosos ambientais.

O advogado Leopoldo Penteado Butkiewicz trabalha com Salles no Ministério do Meio Ambiente desde março de 2020. Assessor especial do ministro desde fevereiro, ele antes ocupou os cargos de diretor do Departamento de Meio Ambiente e América Latina e de secretário-adjunto da Secretaria de Qualidade Ambiental do MMA.

Na decisão em que autorizou a operação da PF e o afastamento de Butkiewicz e de outros nove investigados no Ibama, o ministro do STF Alexandre de Moraes relata que, segundo uma testemunha, o assessor do ministro “tem acesso livre a inúmeros documentos, processos e dados de pessoas físicas e jurídicas autuadas pelo órgão, além do que, segundo noticiado pela autoridade policial, tem intercedido diretamente nesses processos, dando ordens diretamente aos técnicos do órgão”.

Moraes acrescenta que a PF localizou no celular dessa testemunha “diversos diálogos onde a atuação do referido assessor exorbita claramente a esfera de suas atribuições, situação que configuraria patrocínio direto de interesses privados de autuados perante a administração pública”.

A interferência de Butkiewicz no Ibama ocorre desde janeiro, segundo o relato. A testemunha afirmou à PF que nunca tinha visto um assessor do ministro do Meio Ambiente atuar dessa forma no Ibama. “A autoridade policial juntou conversas entre a testemunha e o mencionado agente público (Butkiewicz) que demonstram que ele, de ofício, teria acessado processos no SEI (Sistema Eletrônico de Informações) e, em determinado caso concreto, dito que deveriam ‘levantar o embargo’ e ‘dar prosseguimento’, embora o caso concreto estivesse com autorização vencida, além de ter sugerido a criação de e-mails para a juntada de ofícios, mesmo sendo orientado pela testemunha que o e-mail não seria o canal adequado, haja vista que o SEI já disponibilizaria tal ferramenta”, destacou o ministro do STF.

Na sexta-feira à noite, a Folha de S.Paulo revelou uma troca de mensagens no Whatsapp na qual Butkiewicz aparece tentando desembargar uma fazenda autuada por desmatamento ilegal em Mato Grosso.

A decisão de Moraes relata ainda que a testemunha foi intimidada e teve o computador apreendido pelo assessor de Salles após ter assinado um documento em que relata a paralisação da cobrança de multas provocada por uma medida imposta por Salles, a conciliação ambiental.

Segundo relatos de servidores, Butkiewicz recebeu acesso privilegiado aos sistemas do Ibama que reúnem informações sobre o julgamento de multas e sobre o planejamento de operações de fiscalização. Ele também teria participado de reuniões relacionadas à conciliação ambiental, criada por Salles, em que infratores podem obter desconto de até 60% nas multas.

Butkiewicz é formado em direito pela PUC de São Paulo. Em seu perfil no Linkedin, o assessor de Salles destaca sua atuação por nove anos, antes de assumir os cargos no MMA, como advogado na empresa Ambienta Soluções, de São Paulo, “em ações judiciais em face da Administração Pública para o resguardo do direito de propriedade e da livre iniciativa”, entre outras atividades, como “prospecção de novos negócios em meio ambiente, urbanismo e inovação”.

Delegado na cola de Salles tem histórico

 

A investigação da Polícia Federal que resultou na inédita busca e apreensão contra um ministro do Meio Ambiente (a gente não se cansa nunca dessa frase) e no também inédito afastamento do presidente do Ibama é comandada por um delegado com longo histórico de investigação de crimes ambientais. Em 2005, Franco Perazzoni liderou uma operação inédita que foi responsável pela prisão de 47 servidores públicos envolvidos com madeira ilegal em Mato Grosso.

A Operação Curupira desmontou na época um esquema de corrupção no Ibama e na secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso, levou o secretário e o superintendente do Ibama para a cadeia e deu início de um período de sete anos de queda do desmatamento na Amazônia.

Um ano depois da Curupira, em 2006, outra operação da PF prendeu 24 dos 87 fiscais do Ibama no Rio de Janeiro. Esta operação foi coordenada pelo delegado Alexandre Saraiva, que agora acusa Salles de favorecer madeireiros em notícia-crime apresentada em abril ao STF.

As reações a Perazzoni e Saraiva não tardaram. O Poste… quer dizer, Procurador-Geral da República, Augusto Aras, entrou com ação no STF para barrar investigações da PF que não tenham aval da PGR, informou O Globo. E o homem de Jair Bolsonaro na PF, o diretor-geral Paulo Maiurino, agora quer tirar a autonomia dos delegados para investigar autoridades com foro privilegiado e conceder a prerrogativa a si próprio, segundo a Folha.

Este texto foi publicado na nossa newsletter no último sábado (22/05). Leia aqui

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