Eduardo Bim e Ricardo Salles em cerimônia do Sinaflor, o sistema de controle de madeira do Ibama (Foto: MMA)

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Eduardo Bim é 1º presidente do Ibama afastado no cargo

Segundo a PF, ele contrariou parecer técnico e atuou em favor de madeireiros; conheça os outros servidores afastados

19.05.2021 - Atualizado 11.03.2024 às 08:29 |

DO OC – Ricardo de Aquino Salles assumiu o Ministério do Meio Ambiente em 2019 prometendo fazer uma gestão ambiental diferente de tudo o que a “esquerda” (sic) fez nos últimos 30 anos. Uma coisa ele conseguiu: nesta quarta-feira (19), tornou-se o primeiro ministro do Meio Ambiente da história a sofrer busca e apreensão da Polícia Federal. O procurador da Advocacia Geral da União Eduardo Bim, seu homem de confiança no Ibama, tornou-se o primeiro presidente da autarquia fundada em 1989 afastado pela Justiça no exercício da função.

Segundo o despacho do ministro do STF Alexandre de Moraes que determinou o afastamento, Bim, Salles e outros 21 servidores públicos e empresários são suspeitos de integrar o que a Polícia Federal chama de “um grave esquema criminoso de caráter transnacional”. Bim teria intercedido a favor de empresas madeireiras e da Aimex (Associação das Indústrias Exportadoras de Madeira do Pará) ao revogar uma instrução normativa de 2015 e baixar um despacho autorizando a exportação de madeira sem vistoria da carga.

A decisão de Bim, de 25 de fevereiro de 2020, beneficiou diretamente as empresas Ebata e Tradelink, que em janeiro daquele ano tiveram uma carga de madeira apreendida no porto de Savannah, na Geórgia (EUA). As autoridades americanas na ocasião questionaram o Ibama, que informou não haver licença de exportação para a carga. Em 6 de fevereiro, segundo a PF, representantes da Aimex e da Tradelink tiveram uma reunião com Salles e Bim pedindo a revogação da instrução normativa de 2015 que impunha a necessidade de uma licença de exportação para madeira nativa, além de outros documentos. Dezenove dias depois saiu o chamado “despacho interpretativo” de Bim revogando a norma.

A partir do despacho, passou a valer para a exportação apenas o DOF (Documento de Origem Florestal), uma certidão eletrônica da madeira, amplamente fraudada Amazônia afora. A medida tinha efeito retroativo, legalizando automaticamente milhares de cargas de madeira exportadas em anos anteriores.

A proposta de revogar a norma anterior do Ibama teve a oposição da área técnica. O coordenador do Sistema Nacional de Controle de Origem de Produtos Florestais, André Sócrates de Almeida Teixeira, e outros servidores produziram uma nota técnica desaconselhando a medida. Agora afastado do cargo pela decisão do ministro do STF, o diretor do Ibama João Pessoa Riograndense Moreira Júnior passou por cima da recomendação na época, e Bim autorizou a dispensa da vistoria. Sócrates foi exonerado do cargo por Salles.

Segundo a PF, o movimento do presidente do Ibama, tacitamente autorizado por seu chefe, o ministro do Meio Ambiente, e com o envolvimento de outros servidores do órgão também afastados por decisão do STF, caracterizaria advocacia administrativa – o ato de patrocinar interesses particulares junto a órgãos públicos.

Em junho do ano passado, três organizações da sociedade civil (ISA, Greenpeace e Abrampa) pediram à Justiça do Amazonas a anulação do despacho de Bim, por estimular o desmatamento na Amazônia. A PF obteve sua suspensão liminar diretamente no Supremo.

Alexandre de Moraes também determinou que Bim seja afastado por 90 dias do Ibama. A operação da PF apreendeu documentos, computadores e celulares na sede do instituto, em residências de Salles em Brasília e São Paulo e nos escritórios das madeireiras no Pará. No total, 23 pessoas são alvos da chamada Operação Akuanduba, entre o ministro, servidores do Ibama e empresários.

Não foi a primeira vez que o presidente do Ibama atropelou pareceres técnicos para dar decisões potencialmente prejudiciais ao meio ambiente. Em setembro de 2019, Bim desembargou 22 mil hectares com soja e milho transgênicos em terras indígenas de Mato Grosso visitadas por Salles, que defendera a produção nessas áreas e criticara as multas aplicadas. Cinco meses antes, o presidente do Ibama havia ignorado recomendações da área de licenciamento de petróleo do Ibama e liberado para leilão blocos de exploração próximos ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. Em fevereiro daquele ano, Bim chancelara a criação do chamado “núcleo de conciliação ambiental” no Ibama sem parecer técnico e jurídico. Inventada por Salles, a conciliação na prática paralisou a cobrança de multas pelo Ibama.

A conciliação ambiental tende a produzir mais dissabores para Salles e Bim nos próximos dias. Outras linhas da investigação da Polícia Federal apontam ingerência do Ministério do Meio Ambiente na área de conciliação e julgamentos de infrações do Ibama, além de interferência na fiscalização. No total, estão sendo investigados nove delitos, entre eles corrupção ativa e passiva, obstrução de Justiça, lavagem de dinheiro e facilitação de contrabando.

A decisão de Alexandre de Moraes aponta, por exemplo, que o advogado Leopoldo Penteado Butkiewicz, assessor especial de Salles que também foi afastado do cargo, tinha “acesso livre a inúmeros documentos, processos e dados de pessoas físicas e jurídicas autuadas” pelo Ibama, e afirma que ele “exorbita claramente a esfera de suas atribuições, situação que configuraria patrocínio direto de interesses privados de autuados perante a administração pública”.

Enquanto durar o afastamento de Bim, o Ibama será comandado pelo policial militar aposentado de São Paulo Hiromi Nagao, diretor de Planejamento nomeado por Salles.

Foram afastados dos cargos pelo prazo inicial de 90 dias:

  • O procurador da AGU Eduardo Bim, presidente do Ibama;
  • O servidor do Ibama João Pessoa Riograndense Moreira Júnior, diretor de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas;
  • O advogado Leopoldo Penteado Butkiewicz, assessor especial de Salles no MMA;
  • O policial militar de São Paulo Olivaldi Alves Borges Azevedo, secretário adjunto de Biodiversidade do MMA;
  • O policial militar de São Paulo Wagner Tadeu Matiota, superintendente de Apuração de Infrações do Ibama;
  • O policial militar de São Paulo Olímpio Ferreira Magalhães, diretor de Proteção Ambiental do Ibama;
  • O servidor do Ibama Rafael Freire de Macedo, coordenador-geral de Monitoramento do Uso da Biodiversidade e Comércio Exterior;
  • O servidor do Ibama Leslie Nelson Jardins Tavares, coordenador de Operações de Fiscalização;
  • O servidor da Abin André Heleno Azevedo Silveira, coordenador de Inteligência de Fiscalização do Ibama;
  • O servidor do Ibama Artur Vallinoto Bastos, ex-superintendente no Pará.

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