Mariana Veloso comanda a temperatura na agência onde trabalha

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Não é frescura

Metabolismo feminino precisa de temperaturas mais altas; consenso sobre temperatura pode melhorar eficiência energética em edifícios empresariais, diz estudo

03.08.2015 - Atualizado 11.03.2024 às 08:26 |

CÍNTYA FEITOSA (OC)

Há anos as mulheres lutam por equidade, boas condições de trabalho e melhores salários. Inseridas no mercado e bem-sucedidas em suas carreiras, todos os dias armam-se com seus casacos e colocam-se em oposição aos colegas do sexo masculino para uma disputa que parece não ter fim: a da temperatura do ar-condicionado.

É uma batalha travada em escritórios de todo o mundo. Em geral, os homens calorentos desejam temperaturas baixas, enquanto as mulheres clamam por temperaturas agradáveis – de acordo com os seus padrões.

Cansada de passar frio durante o trabalho, Mariana Veloso, 37, adotou um comportamento extremo: tomou posse do controle do ar-condicionado, que não sai de sua mesa sem sua expressa autorização. “Os homens sugerem que usemos casaco para nos sentirmos confortáveis, mesmo que lá fora esteja muito quente”, conta a publicitária, que vive em Brasília e leva uma blusa de frio para o trabalho mesmo no calor da capital.

Veloso e milhões de mulheres acabam de ganhar um bom argumento para lutar contra a opressão masculina dos refrigeradores de ar: o ajuste universal de temperaturas dos prédios comerciais, feito para – e por – homens, ajuda a esquentar o planeta.

Um estudo divulgado nesta segunda-feira (03/08) no periódico Nature Climate Change mostra que os modelos que preveem a temperatura média ideal em ambientes fechados foram construídos sem considerar as diferenças de metabolismo entre homens e mulheres. Consequentemente, enviesam as previsões de consumo de energia dos edifícios empresariais, inviabilizando a eficiência energética.

Como o setor de edificações responde por 6,4% das emissões diretas de CO2 e por 12% das emissões relacionadas ao uso de eletricidade, o padrão que causa o desconforto nas mulheres ajuda a agravar as mudanças climáticas.

As normas que regulam a temperatura desses ambientes são feitas com base na previsão e avaliação do conforto térmico. Em diferentes modelos, nota-se que as mulheres sentem mais desconforto com a variação de temperatura, mas essa questão não é levada em consideração ao definir a temperatura ideal nem o consumo médio de energia, diz a pesquisa.

O modelo desenvolvido pelo físico dinamarquês Ole P. Fanger usa a taxa metabólica para calcular as condições ambientais que satisfaçam equilíbrio térmico entre o corpo e o ambiente. O padrão é definido pelo PMV (sigla para o termo em inglês predicted mean vote), que expressa o conforto térmico em uma escala de sete pontos, que vão do frio (-3) a quente (3), a partir da aplicação de questionários. Embora Fanger tenha verificado, durante a elaboração do modelo, que as mulheres são mais sensíveis do que os homens diante de flutuações na temperatura, essa diferença não foi considerada.

De acordo com a pesquisa divulgada nesta segunda-feira, os valores-padrão para a taxa metabólica são baseados em uma média masculina, e podem superestimar a taxa do sexo feminino em até 35%. Isso significa que, em situações de repouso, as mulheres demoram mais para se aquecer. Isso faz com que os edifícios sejam ineficientes no fornecimento de conforto para as mulheres – e ineficientes energeticamente.

“Devemos representar fielmente a demanda térmica de todos os ocupantes para uma fonte térmica eficiente e precisa. Isso vai levar a menos desperdício de energia”, diz Boris Kingma, da Universidade de Maastricht, Holanda, um dos autores do estudo. “Ainda há muito o que fazer para atingir padrões de eficiência energética, mas a conscientização nesses escritórios já é alguma coisa.” Por ‘conscientização’, Kingma também entende o uso de roupas menos pesadas pelos homens em dias quentes.

O estudo sugere que a fórmula também deve ser atualizada, em especial porque a participação feminina no mercado de trabalho teve um aumento considerável desde que o modelo foi desenvolvido. No Brasil, as mulheres representavam pouco mais de 15% da força de trabalho. Atualmente, o número ultrapassa os 40%.

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