Trump declara saída de Paris e revolta mundo
Americano diz que tentará “renegociar” uma volta ao tratado “em termos justos” e é rebatido pelo presidente da França; Barack Obama diz que seu sucessor “rejeita o futuro”
LUCIANA VICÁRIA
CLAUDIO ANGELO
DO OC
O presidente Donald Trump cumpriu a ameaça que fez durante a campanha e anunciou na tarde desta quinta-feira (01) que os Estados Unidos estão se retirando do Acordo de Paris e buscarão “renegociar” o tratado global contra a mudança climática “em novos termos, que sejam justos para com os Estados Unidos”.
A saída formal deve levar três anos para se efetivar, pelas regras do acordo. Mas, desde já, ela significa não mais ter de perseguir a meta de redução de emissão de 26% a 28% até 2025 em relação a 2005, e paralisar o apoio ao Fundo Verde do Clima, que financia projetos em países em desenvolvimento. Em um discurso de meia hora no jardim da Casa Branca, para uma plateia de negacionistas climáticos, Trump ironizou o fundo, que chamou de “esquema para distribuir a riqueza produzida pelos americanos”.
Apesar de esperada, a decisão do presidente americano causou choque e revolta no mundo inteiro. Uma das reações mais veementes veio do presidente do país onde nasceu o acordo do clima. O francês Emmanuel Macron fez uma aparição na TV às 23h para criticar fortemente o americano. Chamando a saída de “um erro” e dizendo que os EUA haviam “dado as costas para o mundo”, Macron avisou, falando em nome dos europeus: “Não renegociaremos um acordo menos ambicioso”.
Não está claro se a proposta de “renegociação” é mais um delírio trumpista ou uma tentativa real de forçar concessões em algum ponto, bem ao estilo de corretor de imóveis com o qual Trump fez sua carreira. Mas não parece ter colado com ninguém que acompanha as negociações internacionais. Essas pessoas lembram que o Acordo de Paris foi feito sob medida para acomodar os interesses americanos.
A Climate Action Network, rede de mais de 900 organizações não-governamentais, disse que a decisão de Trump foi “desajuizada” e prejudicará antes de tudo os norte-americanos, que sofrerão com mais impactos da poluição e do aquecimento global, além de verem perdidas oportunidades de emprego em energias limpas.
Até a normalmente comedida diplomacia brasileira, pouco afeita a comentar decisões domésticas dos outros, subiu o tom. Uma nota conjunta entre Itamaraty e Ministério do Meio Ambiente divulgada no começo da noite de quinta-feira expressa “profunda preocupação e decepção” com o anúncio americano e com o impacto da decisão para o sistema multilateral. “O Brasil continua comprometido com o esforço global de combate à mudança do clima e com a implementação do Acordo de Paris. O combate à mudança do clima é processo irreversível, inadiável e compatível com o crescimento econômico, em que se vislumbram oportunidades para promover o desenvolvimento sustentável e para novos ganhos em setores de vanguarda tecnológica”, afirma a nota.
Protestos também vieram de dentro de casa. Após o anúncio da Casa Branca, o empresário Elon Musk, dono da fábrica de carros elétricos Tesla, anunciou que estava abandonando o posto de conselheiro econômico de Trump. “A mudança climática é real. Sair de Paris não é bom para a América ou para o mundo.”
Rompendo a regra não-escrita dos ex-presidentes de jamais se manifestarem publicamente sobre a administração dos sucessores, Barack Obama, que negociou o Acordo de Paris, disse que seu adversário republicano “rejeita o futuro” e que as demais nações que permanecem no Acordo de Paris colherão os benefícios de se manter no pacto. Também afirmou que os estados, as cidades e as empresas americanas farão ainda mais pra liderar um caminho próspero que ajude a proteger as gerações futuras.
Em seu discurso, Trump criticou as metas do acordo estipuladas a países como a China, hoje maior emissor de gases de efeito estufa, e afirmou que o acordo é “muito injusto com os EUA”, citando especificamente as usinas a carvão, supostamente permitidas ao país asiático e proibidas aos EUA. “Este acordo é menos sobre o clima e mais sobre outros países ganhando vantagens financeiras sobre os Estados Unidos”, disse.
No final de seu discurso, o presidente disse que a retirada do acordo é uma reafirmação da soberania dos Estados Unidos. “O Acordo de Paris enfraquece a nossa economia, limita os nossos trabalhadores, impõe riscos legais e nos coloca em desvantagem permanente em relação aos demais países do mundo.”
Scott Pruitt, chefe da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), encerrou o pronunciamento dizendo que a América finalmente tem um líder que responde apenas aos cidadãos e que os Estados Unidos não devem se desculpar pela administração ambiental. “Antes de o Acordo de Paris ter sido assinado, a América reduziu sua pegada de gás carbônico a níveis equivalentes ao dos anos 90”. Segundo Pruitt, os esforços dos EUA deveriam convergir para o estímulo à exportação de tecnologia e inovação. “Esse deve ser nosso foco, e não concordar com metas inatingíveis que prejudicam a economia e o povo americano”.
Ambos foram aplaudidos várias vezes. No final da transmissão, é possível ouvir alguém da plateia gritar: “Acreditam em aquecimento global agora?”