Foto: Vinícius Mendoça/Ibama

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“Amazônia perdida”: 38% da floresta sofre com degradação, aponta estudo

Fogo, extração de madeira, secas extremas e efeitos secundários de desmatamentos em áreas próximas causam a perda gradual de vegetação; degradação emite tanto ou mais CO2 que desmatamento

27.01.2023 - Atualizado 11.03.2024 às 08:30 |

DO OC – Estudo liderado por cientistas brasileiros foi destaque na edição desta sexta-feira (27/1) da revista Science, que estampou em sua capa a chamada “Amazônia perdida — degradação e destruição florestal”. A pesquisa The drivers and impacts of Amazon forest degradation concluiu que cerca de 38% da área da floresta sofre com degradação causada por ação humana e já não tem as mesmas funções e capacidade de regeneração de uma área intocada. 

Diferentemente do desmatamento (quando a área de floresta é derrubada e substituída por outro tipo de cobertura da terra), a degradação significa uma perda gradual de vegetação causada por ação humana. Ou seja: o desmatamento recorde derruba a floresta, e a parte que resiste de pé é destruíuda de outras formas. “A maioria das análises do uso da terra e cobertura do solo na floresta amazônica tem se concentrado nas causas e efeitos do desmatamento. No entanto, a ação humana causa degradação no que resta da floresta e ameaça seu futuro”, diz o texto, em tradução livre. 

Segundo os pesquisadores, os principais impulsionadores da degradação são o fogo, a extração de madeira (majoritariamente ilegal), o chamado efeito de borda (quando áreas de floresta são modificadas e perdem suas características por efeitos secundários de desmatamento em áreas vizinhas) e as secas extremas, que se tornam mais intensas e frequentes com as mudanças climáticas. 

O estudo, liderado por David Montenegro Lapola, do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e Patrícia Pinho, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), mostrou ainda que a degradação pode resultar em emissões de gases-estufa em igual ou maior quantidade que o desmatamento. As emissões de CO2 resultantes da degradação são estimadas entre 50 milhões de toneladas e 200 milhões de toneladas ao ano, e as resultantes de desmatamento estão entre 60 milhões de toneladas e 210 milhões de toneladas ao ano. 

Os cientistas destacam a necessidade de ações específicas para o enfrentamento à degradação da floresta, já que suas causas permanecerão mesmo que o desmatamento seja contido. “Alguns dos impulsionadores [da degradação], como o efeito de borda, podem ser combatidos com a redução do desmatamento. Mas outros, como a restrução das secas extremas, demandam medidas adicionais, incluindo esforços globais para reduzir as emissões de gases de efeito estufa”.

O estudo sugere a criação de um sistema de monitoramento integrado, o reforço na prevenção e combate à extração de madeira ilegal, o controle do uso do fogo e maior atenção aos projetos de REDD+ (mecanismo da UNFCCC que prevê incentivos financeiros a países que reduzem emissões decorrentes de degradaçãpo florestal e desmatamento). 

A mesma edição da Science publicou outra pesquisa sobre a Amazônia, liderada por Carlos Nobre, do IEA/USP. O trabalho  Human impacts outpace natural processes in the Amazon aponta como transformações no bioma que levariam, em condições naturais, milhões de anos, estão ocorrendo em poucas décadas, comprometendo a capacidade de renovação da floresta. 

Efeito dominó

Ontem, cientistas divulgaram novos dados sobre os impactos dos extremos climáticos da Amazônia no mundo. Jurgen Kurths, pesquisador do Potsdam Institute for Climate Impact Research, na Alemanha, afirmou que o grupo de cientistas que conduziu a pesquisa se surpreendeu ao verificar “o quão intensamente os extremos climáticos na Amazônia estão conectados aos extremos climáticos no Tibete”. 

As geleiras da região têm derretido rapidamente, como resultado do aquecimento global. O Tibete é responsável pelo fornecimento de água para aproximadamente dois bilhões de pessoas, e por isso é chamado de “a caixa d’água da Ásia”. 

Os pesquisadores utilizaram dados sobre a temperatura da superfície terrestre coletados nos últimos 40 anos para mapear as conexões entre eventos climáticos em diferentes continentes, partindo da América do Sul, passando pelo sul da África e pelo Oriente Médio e chegando ao Tibete. Os resultados indicaram que, quando a Amazônia esquentava, as temperaturas também subiam, consistentemente, no Tibete. 

Kurths ressaltou que as mudanças climáticas estão diretamente ligadas à ação humana, e citou as emissões de gases de efeito estufa, sobretudo o dióxido de carbono resultante de desmatamento e degradação na Amazônia, como “um problema global”. “Isso precisa parar imediatamente. Estamos diante do perigoso ‘ponto de virada’”, afirmou, referindo-se à “savanização” da floresta tropical.

 

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