Navio-sonda da Petrobras (Foto: Petrobras)

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Petroleiras geraram US$ 20 tri em dano climático

Estudo avaliou 25 grandes empresas, inclusive Petrobras, e concluiu que, mesmo se tivessem custeado todo o prejuízo que causaram desde 1985, ainda teriam lucro líquido de US$ 10 tri

16.11.2023 - Atualizado 11.03.2024 às 08:31 |

DO OC – As perdas e os danos da crise climática poderiam ter sido cobertos pelas maiores empresas de combustíveis fósseis sem prejuízo aos lucros, mostra relatório publicado nesta quinta-feira (16) pela Climate Analytics. A análise calculou que o prejuízo climático causado pelas emissões das 25 principais petroleiras entre 1985 e 2018 é estimado em US$ 20 trilhões, ou 12 vezes e meia o PIB do Brasil. O lucro do grupo no mesmo período foi de aproximadamente US$ 30 trilhões, o que significa que ele ainda sairia ganhando mesmo pagando pelo estrago.

São chamados de perdas e danos os impactos climáticos que geram prejuízos humanos e financeiros. Em 2022, por exemplo, além de uma onda de calor, o Paquistão enfrentou tempestades que mataram quase 2 mil pessoas. Mais de um milhão de casas foram danificadas ou destruídas e ao menos 800 mil animais foram perdidos. Estima-se que houve US$ 15,4 bilhões de prejuízos em perdas e US$ 14,9 bilhões em danos.

A Climate Analytics estimou os impactos associados às emissões dos escopos 1, 2 (aquelas oriundas do processo de extração e da energia disponibilizada por terceiros para a produção) e 3 (as emissões pelo uso dos produtos) e comparou com os ganhos financeiros. As próprias empresas buscam compartilhar a responsabilidade pelas emissões com a sociedade (que consome o petróleo) e os governos (que o subsidiam). Por isso os pesquisadores chamam o prejuízo de “dano parcial” e dizem que seu cálculo é conservador. A conta real poderia ser até três vezes maior.

A principal emissora, a saudita Aramco, teve ganhos financeiros no valor de US$ 5,4 trilhões entre 1985 e 2018, mas poderia ter pago US$ 2,8 trilhões pelos danos climáticos parciais no mesmo período. O lucro da Companhia Nacional de Petróleo Abu Dhabi (ADNOC) foi de US$ 1,7 trilhão, enquanto o valor estimado para os danos parciais foi de US$ 700 bilhões.  A empresa liderada por Sultan Al-Jaber, anfitrião da COP28 (Conferência Climática), é a 10° mais suja. A América Latina é representada por três empresas: a mexicana Pemex (5°), a Petróleos da Venezuela (11°) e a Petrobras (17°). Os ganhos da brasileira foram estimados em US$ 700 bilhões, enquanto os investimentos estimados para cobrir os impactos climáticos causados pelas atividades e produtos dela poderiam ser de US$ 500 bilhões.

O grupo de pesquisadores teve acesso a dados referentes a 2022 de sete empresas e averiguou que o lucro foi quase o dobro dos danos causados pelas emissões delas naquele ano – US$ 497 bilhões em comparação com US$ 260 bilhões que poderiam ser direcionados para perdas e danos.

O ano passado, inclusive, viu recordes nos lucros e no recebimento de subsídios no setor petrolífero. As petroleiras tiveram um subsídio público recorde, no valor de US$ 7 trilhões para, evitar o aumento do preço do combustível para o consumidor e manter os produtos competitivos no pós-pandemia. Os maiores bancos privados do mundo mantiveram a tradição de despejar bilhões de dólares nas mãos de produtoras de combustíveis fósseis.

Apesar do fluxo de dinheiro, a indústria investiu menos de 1% em despesas para produções de baixo carbono, lembra o estudo. A Shell e a BP, por exemplo, diminuíram os planos que seriam favoráveis ao clima, apesar de ainda não serem os ideais.

“Depois dos superlucros do ano passado, algumas destas empresas estão retrocedendo nos seus compromissos climáticos, mostrando que não podemos contar com elas para fazerem isto por si próprias – certamente não ao ritmo que necessitamos. Os governos devem intervir e tributar os poluidores para pagarem pelas perdas e danos que estão causando. Também precisamos de um compromisso firme no resultado da COP28 para eliminar gradualmente os combustíveis fósseis para manter vivo o 1,5°C [limite de aumento na temperatura global proposto no Acordo de Paris]”, diz Marina Andrijevic, uma das autoras do estudo.

O relatório também ressalta que há décadas as petroleiras sabem do impacto negativo dos combustíveis fósseis para o clima. A ExxonMobil, por exemplo, produziu em 1977 projeções sobre o aquecimento global. “Em vez de agir com base nas evidências, ou talvez de forma menos ambiciosa, mas sem encobrir nada, muitas empresas optaram por promover e difundir alegações falsas e enganosas sobre as mudanças climáticas”, diz o relatório.

Na COP27, conferência climática realizada ano passado no Egito, os líderes mundiais concordaram que os acordos de financiamento existentes não eram suficientes para sanar as lacunas em perdas e danos. Assim, criaram um comitê com 24 membros, incluindo alguns pequenos Estados insulares, para elaborar as diretrizes para a criação de um fundo financeiro direcionado às perdas e danos. As recomendações do comitê deverão ser apresentadas no mês que vem na COP28, em Dubai.

O fundo de perdas e danos será um dos grandes contenciosos da COP. Países ricos resistem em contribuir com o que é necessário a fundo perdido e vêm buscando “aumentar a base de doadores”, ou seja, exigir contribuições da China e de outras nações emergentes. Os países em desenvolvimento retrucam que isso é golpe.

Durante a COP27, Mia Mottley, primeira-ministra da ilha caribenha de Barbados, defendeu a tributação das petroleiras para que houvesse investimento em perdas e danos. “Como as empresas que tiveram US$ 200 bilhões de lucros nos últimos três meses esperam não contribuir com pelo menos 10 centavos de cada dólar do lucro para um fundo de perdas e danos?”, perguntou na ocasião. Meses antes, em discurso realizado na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, o secretário-geral António Guterres, já havia proposto que as produtoras de combustíveis fósseis fossem taxadas para financiar perdas e danos. (PRISCILA PACHECO)

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